quarta-feira, 5 de outubro de 2011

"E eis que exercemos as nossas vinganças"


"Senhora Vingança" é um livro de contos directamente saído da criatividade do líder carismático da banda de Heavy Metal portuguesa Moonspell, Fernando Ribeiro.

Após outras incursões pelo mundo literário, nomeadamente na poesia, Fernando Ribeiro aventurou-se na prosa com este livro que contém dois contos que não podiam ser mais diferentes. A única linha condutora que se mantém fiel é, como o título manda, o plano para executar uma merecida vingança.

O primeiro, confesso, é muito pouco interessante, ao ponto de quase ter desistido de ler o segundo. 

Parece que o Fernando Ribeiro, como bom gótico, é fã das histórias clássicas vampíricas, daquelas em que eles são muito pálidos, só saem de noite, só entram se convidados, não frequentam o colégio dos morangos com açúcar e são sedentos de sangue.
Se assim for, percebo o ressabiamento de escrever este conto em que a vingança é contra uma escritora que desvirtua todo este ambiente vitoriano, permitindo que vampiros se camuflem entre adolescentes na aula de biologia e que se alimentam de produtos sintéticos ao invés de sangue.   
A questão é que as referências à escritora da saga Twiligh são tão óbvias e tão forçadas que fazem perder o interesse no conto. 

Mas pronto. Não sou um tipo de "crítico literário" que se acomoda e se deixa vencer por um pequeno contratempo. AH! Voltando um bocadinho atrás e para salvar a minha honra - apesar de não ter gostado do conto, sou solidário com o Fernando: Twilight é mesmo uma cena que não deve assistir a ninguém e que não deve ser assistido por ninguém. 

Mas, dizia eu, permaneci perseverante. E ainda bem que o fiz!

O segundo conto é fantástico.

Fala de outro tipo de vampiros. Os vampiros políticos.
Com uma mestria literária que o primeiro conto não faria prever, Fernando descreve com pormenor factos, pessoas, lugares e situações da nossa suposta democracia, do nosso suposto sistema capitalista. Digo suposto porque, como se verá, um sistema só o é quando todas as suas estruturas trabalham para o bem comum. No nosso "sistema", os nossos representantes, aqueles que o povo escolhe desde o 25 de Abril, ao invés, trabalham para o seu próprio  (demasiado) bem estar.

E pelo caminho fazem o quê?

Roubam-nos o subsídio de natal. Despedem pessoas. Aumentam o IVA da electricidade para 23%. Tudo em nome do "emagrecimento" ou do corte das "gorduras" do Estado, que é como quem diz, despedir, cortar nas regalias dos pequenos, para que os grandes possam continuar a jogar a sua partida de golfe com material comprado com IVA reduzido como é apanágio para a prática de desportos de luxo. Faz sentido. não faz? Não?!

Pois não.

Os protagonistas deste conto também concordam. A questão, no entanto, é que eles não se ficam por escrever, por organizar lutas e contestações ou trabalhar na comunidade.

Eles infiltram-se e cortam a cabeça ao polvo.

E eis que eles exercem as nossas vinganças.

Posto isto, aconselho-vos a não perder este conto. Podem sempre comprar o livro ou pedir-mo emprestado e começarem a ler a partir do meio.

Boas leituras e, quem sabe, pequenas vinganças...
BM

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